domingo, 26 de fevereiro de 2017

TOPTULHO MUSICAL # 114! (ESPECIAL ADRIANA CALCANHOTTO)





E foi essa semana mesmo que li a notícia de que Adriana Calcanhotto largou tudo aqui no Brasil para lecionar na Universidade de Coimbra, em Portugal. Esse fato corroborou a impressão que sempre tive da moça - de que sua musicalidade é extremamente literária - que ela é, na verdade, uma Modernista - que a Academia de Letras conservadora (a mesma que demonizou Bob Dylan por ter ganho o Nobel literário) não me ouça!

Drica já é velha conhecida do EnTHulho Musical. Um dos textos que mais gosto (que fiz sobre ela), foi quando ela foi Artista Do Mês, há exatos 6 anos (Fevereiro/2011):

"A tão antiga cumplicidade entre música e literatura...
A teoria musical de qualidade é o trinômio de "ias": melodia, harmonia e poesia. Tem artista que vai aquém e esquece sorrateiramente algum dos elementos. Outros sobrecarregam uns em desfavor de outros e assim se faz a música brasileira: sem fórmula certa, mas que de alguma forma dá certo.
Não sei como enquadrar Adriana Calcanhotto nesse parâmetro: sequer sei se há parâmetro. Sua obra é tão vasta e polivalente que não se consegue situar em qualquer categoria estreita ou pré-determinada. Arrisco dizer que seu trabalho é como a sexualidade de qualquer pessoa: desnecessita de rótulos ou denominações. Estudar sua carreira é constatar que ela é pop, cult, juvenil, adulta, poética, alegre, melancólica, eletrônica, voz-e-violão... um jogo infinito de paradoxos reinventados a cada fase. Não é de se estranhar que obtem fãs de extremidades igualmente opostas: dos humildes aos mais elitizados, todos se deleitam ao sabor de Drica.
Por excelência uma das mais admiradas cantoras dentre os leitores do EnTHulho Musical, estava mais do que na hora dela ganhar um mês inteirinho dedicado a seus discos, músicas, fatos, curiosidades, erros, acertos e tudo o mais. Tem pano demais pra manga e muito o que se discorrer sobre essa poetisa do Rio Grande do Sul, mas com genialidade de descrever com propriedade a cena carioca (onde morou) e a capacidade de usar e abusar de sua visão sobre o que há a seu redor - sejam as pessoas (cariocas são bonitos...cariocas são ousados), sejam abstrações ("não sei bem onde larguei o leão que sempre cavalguei"), ou homenagens ousadas (vamos comer Caetano...comê-lo cru).

Navegar a marítima trajetória de Adriana é ter uma aula completa de literatura. É perceber as influências diretas (Caetano Veloso, Lupicínio Rodrigues, Augusto de Campos, Gerture Stein, dentre tantos outros), condensadas em melodias deliciosas e letras que te traduzem e possuem uma atomosfera rítimica que te dão a sensação de viajar. Embarquemos já, pois!"



De igual forma, o sempre parceiro professor Daniel Vícola também já deixou suas impressões sobre Adriana, cada vez mais aproximado ao universo literário da artista, também em Fevereiro de 2011 (coincidentemente, também num 26/02, como hoje, e também era Carnaval!), com a crônica "VAMBORA": 

"Só a voz e o talento musical já seriam suficientes para me cativar mas, neste caso, fomos além: ela ainda era inteligente e sensível, poeticamente loquaz e milimetricamente precisa no seu traduzir as emoções; fazia-me crer, com requintes de magia, que observávamos o mundo de lugares diferentes, mas – como duvidar? - sob o mesmo prisma, do mesmo ângulo... Não sei bem por qual razão mas, até há bem pouco tempo, acreditava que compartilhávamos, inclusive, a mesma casa zodiacal. É que alguns encontros são tão perfeitos que quase os inventamos em mapa astral e forjamos coincidências que os tornem ainda mais incríveis – como se fosse necessário melhorar aquilo que, por si só, já é suficientemente bom e epifânico. Como disse, errei. Ela, libriana melíflua de “remoto controle”. Eu, uma casa atrás, esquadrinhando tudo, atento, do meu cantinho: virginianíssimo. Acho que “filtrar os graus” deve ser, de longe, a tarefa a que ela e eu mais nos dedicamos.
Ela, então, verte observações em letra e música como se, depois de criar a alma, fosse capaz de lhe dar um corpo ao qual realmente merecesse estar unida, por força e graça da mais fina sintonia, transformando o produto final naquilo que todo artista pretende que seu trabalho seja: porta-voz das emoções e do modo de ver que deram, afinal, origem e sentido àquilo.
E, sim, tenho o palpite de que muitos concordarão quando digo que Adriana é isso: uma sensibilidade vitoriosa, capaz de se fazer ouvir e sentir sem muito esforço, posto que é inteligentemente simples, embora, simultaneamente, encerre complexa sabedoria ao descrever tão bem, em linhas musicais, estados d´alma, por vezes, tão custosos de se traduzir ou assumir.
Dei-me conta disso quando, num daqueles repentes felizes, subitamente escutei numa canção sua uma verdade, meu Deus, tão minha: “Há algo que jamais se esclareceu: onde foi, exatamente, que larguei, naquele dia mesmo, o leão que sempre cavalguei?”
Passei, junto dela, a procurar o tal leão que, muito vezenquando, reencontro aqui e ali, lembrando-me sempre de agradecê-la pelo conselho, pela luz, pela metáfora tão bem construída de uma vida que, teimosa, insiste em se decompor e se recompor só pra ver se há na reinvenção alguma graça, algum motivo, algum regozijo oculto – quiçá clandestino?
Porque embora haja a dor, o sufoco, as perguntas sem respostas e o eterno perscrutar da alma e do sentir alheio que nos causam enorme cansaço e nos desafiam os esquadros do entendimento, há também momentos outros em que, de nós desatados, podemos nos render à “maresia” e conhecer outros portos, outras nuances, maneiras mais leves de sentiviver guiados – oh, maravilha! – pela mesma voz e pela mesma sabedoria das horas mais profundas e analíticas de existir.
Sim, porque quem tem sensibilidade suficiente para tocar, através da música, questões tão profundas da humanidade, também há de ter (como Adriana tem!) olhos bem atentos para o que é simples, despretensioso e franciscano. Aquilo tudo a que, se você entende o que viver realmente representa, sabe dar valor e aproveitar até a última gotinha.
Eis, de novo, a diferença: eu aproveito, ela, musica! Torna tudo em delícias cantadas só para nos ouriçar ainda mais os sentidos e potencializar o desfrute, o sorver, o entender da coisa!
É que, “cantadas”, as verdades doem menos. O espelho fica menos agressivo e, o melhor disso tudo, o que é bom não deixa de acontecer: refletimos. Passamos, sorrindo, por momentos que, sem as cores e o encanto da boa música, talvez fossem insuportavelmente cinza e sofridos.
É o poder do pozinho mágico de “par-tim-pim”: dar asas ao coração e à imaginação de forma doce, embalando sonhos, ratificando frustrações, fazendo explodir os desejos e as revoltas de uma maneira que, de tão poética, nem configura mais agressão, é antes um grito musicado de liberdade ou, quem sabe, de redenção pela arte.
Sei é que Adriana me justifica, por isso eu a amo. Experimento, através dela, a maravilhosa sensação de cumplicidade não de ações, mas de motivos. Aquela sintonia mais profunda, capaz de fundir em amálgama duas sensibilidades afins. Dois gritos que ecoam no espaço a favor de uma mesma almejada liberdade. Dois questionadores. Dois pensa-dores. Duas lágrimas de alegria ao final da mesma epifania.
Ah, que mais dizer? Melhor sentir. O silêncio dará cabo de maneira mais satisfatória da tradução do que vem depois...

Vambora!"



O EnTHulho resolveu falar dessa maravilha hoje, fazendo um carnaval mais intelectual e de qualidade para vocês, e ela foi eleita a dona do TopTulho de hoje! Perguntei aos internautas quais suas preferidas da carreira de Adriana e o resultado foi o seguinte:

1) INVERNO (Álbum "A Fábrica Do Poema", de 1994)
2) ESQUADROS (Álbum "Senhas", de 1994)
3) MENTIRAS (Álbum "Senhas", de 1994)
4) VAMBORA (Álbum "Marítmo", de 1998)
5) MARESIA (Coletânea "Perfil", de 2001)
6) CANTADA (DEPOIS DE TER VOCÊ) (Álbum "Cantada", de 2002)
7) NAQUELA ESTAÇÃO (Álbum "Enguiço", de 1990)
8) DEVOLVA-ME (Coletânea "Perfil", de 2001)
9) METADE (Álbum "A Fábrica Do Poema", de 1994)
10) MAIS FELIZ  (Álbum "Marítmo", de 1998)
11) MULHER SEM RAZÃO (Álbum "Maré", de 2008)
12) GATINHA MANHOSA (Álbum "Partimpim Dois", de 2009)
13) MALDITO RÁDIO (Álbum "O Micróbio Do Samba", de 2011 - faixa bônus)
14) CARIOCAS (Álbum "A Fábrica Do Poema", de 1994)
15) FICO ASSIM SEM VOCÊ (Álbum "Partimpim", de 2004)
16) POR ISSO CORRO DEMAIS (Coletânea "Perfil", de 2001)
17) SENHAS (Álbum "Senhas", de 1994)
18) TRÊS  (Álbum "Maré", de 2008)
19) OITO ANOS (Álbum "Partimpim", de 2004)
20) JUSTO AGORA  (Álbum "Cantada", de 2002)

TAMBÉM FORAM VOTADAS:

21) SOU SUA
22) MORTAES
23) MARINA
24) DO FUNDO DO MEU CORAÇÃO
25) EU VIVO A SORRIR
26) PARA LÁ
27) SEU PENSAMENTO
28) CANÇÃO DA FALSA TARTARUGA
29) PORTO ALEGRE
30) CAMINHONEIRO
31) VAMOS COMER CAETANO
32) FELICIDADE
33) TAJ MAHAL
34) VOLTA
35) O TRENZINHO DO CAIPIRA
36) BACK TO BLACK
37) POR QUE VOCÊ FAZ CINEMA?
38) MEDO DE AMAR Nº 2

MÚSICAS RELEVANTES NÃO VOTADAS:

ACONTECEU
ÁGUA PERRIER
ALEXANDRE
BAGATELAS
BEIJO SEM
BORBOLETA
CANÇÃO DE NOVELA
CIRANDA DA BAILARINA
CLANDESTINO
DISSERAM QUE VOLTEI AMERICANIZADA
...E O MUNDO NÃO SE ACABOU
E SENDO AMOR
LINDO LAGO DO AMOR
MUSIC-IMPRESSIVE INSTANT
ONDE ANDARÁS
OUTRA VEZ
PARANGOLÉ PAMPLONA
PELOS ARES
QUEM VEM PRA BEIRA DO MAR
REMIX SÉCULO XX
SE ACASO VOCÊ CHEGASSE
SE TUDO PODE ACONTECER
SEGUNDOS
TÁ NA MINHA HORA
TEMA DE ALICE
TONS
VAI SABER?


Encerrando essa merecida homenagem, fiquemos agora com a primeiríssima posição: Inverno, faixa essencial do universo de Adriana Calcanhotto! E mais uma vez, MUITO OBRIGADO pela participação de vocês!


INVERNO
Adriana Calcanhotto// Antônio Cícero

No dia em que fui mais feliz
Eu vi um avião
Se espelhar no seu olhar até sumir

De lá pra cá não sei
Caminho ao longo do canal
Faço longas cartas pra ninguém
E o inverno no Leblon é quase glacial

Há algo que jamais se esclareceu
Onde foi exatamente que larguei
Naquele dia mesmo
O leão que sempre cavalguei

Lá mesmo esqueci que o destino
Sempre me quis só
no deserto sem saudade, sem remorso só
Sem amarras, barco embriagado ao mar

Não sei o que em mim
Só quer me lembrar
Que um dia o céu
reuniu-se à terra um instante por nós dois
pouco antes do ocidente se assombrar.

No dia em que fui mais feliz
Eu vi um avião
Se espelhar no seu olhar até sumir

De lá pra cá não sei
Caminho ao longo do canal
Faço longas cartas pra ninguém
E o inverno no Leblon é quase glacial

Há algo que jamais se esclareceu
Onde foi exatamente que larguei
Naquele dia mesmo
O leão que sempre cavalguei

Lá mesmo esqueci que o destino
Sempre me quis só
no deserto sem saudade, sem remorso só
Sem amarras, barco embriagado ao mar

Não sei o que em mim
Só quer me lembrar
Que um dia o céu
reuniu-se à terra um instante por nós dois
pouco antes do ocidente se assombrar.

Não sei o que em mim
Só quer me lembrar
Que um dia o céu
reuniu-se à terra um instante por nós dois
pouco antes do ocidente se assombrar.

Não sei o que em mim
Só quer me lembrar
Que um dia o céu
reuniu-se à terra um instante por nós dois
pouco antes do ocidente se assombrar.

No dia em que fui mais feliz...



Digam a verdade: deixei o domungo de vocês melhor, não foi? Mas ainda não acabou não...chegou a hora do...



Agora chegou a vez do TopTulho Musical contemporâneo, sua parada de MPB predileta da internet!

Vocês viram que, na edição passada, fiz um esforço hercúleo para não falar mal de Anitta (que, aliás, continua na primeira posição). Pois é, até o fechamento do post da semana passada, ela ainda não tinha se auto-intitulado como a "Cura Gay" em público. Achei isso o cúmulo da arrogância, ignorância e do close errado (aliás, ela é mestra nisso), portanto, perdoem-me os fãs, mas VTNC, Anitta!

Nessa edição, temos a esplendorosa estreia de Elza Soares, pintando pela primeira vez aqui no TopTulho, com a música "A Mulher Do Fim Do Mundo", cujo clipe foi anunciado para ser lançado depois do carnaval. Vida longa Pra Elza que, ao contrário de Anitta, é sim uma artista que realmente importa!

E a gente destaca a suave Céu, que manteve-se na nona posição com a música "A Nave Vai", faixa de seu disco "Tropix", lançado ano passado. A gente vê primeiro como ficou a parada dessa semana, e depois, curtimos o som da gata!

TOPTULHO MUSICAL - EDIÇÃO # 114 - 26/02/2017

1) ANITTA & MALUMA - Sim Ou Não (=) (4 Semanas)   
2) ANA VILELA - Trem Bala (=) (8 Semanas)  
3) SIMONE SABACK & CÁSSIA ELLER - Mãos Atadas (=) (9 Semanas)  
4) MOSKA - Impaciente Demais (+4) (7 Semanas) 
5) CLARICE FALCÃO - Eu Escolhi Você (-1) (8 Semanas)  
6) MAHMUNDI - Meu Amor (-1) (8 Semanas)    
7) SILVA - Ainda Lembro (-1) (8 Semanas)  
8) ZECA PAGODINHO - Toda Hora (+3) (5 Semanas) 
9) CÉU - A Nave Vai (=) (8 Semanas) 
10) LUCIANA MELLO - Joia Rara (+2) (7 Semanas)  
11) ANAVITÓRIA & TIAGO IORC - Trevo (+2) (3 Semanas)
12) CIDADE NEGRA - Batendo Na Sua Porta (+3) (5 Semanas)
13) LEO FRESSATO & A BANDA MAIS BONITA DA CIDADE - Oração (DeepLick Remix) (-6)(5 Semanas) 
14) PITTY - Dê Um Rolê (-4) (10 Semanas)     
15) FREJAT - Vambora (+1) (4 Semanas) 
16) DIOGO NOGUEIRA - Pé Na Areia (+1) (3 Semanas)
17) MART'NÁLIA - Eu Te Quero Agora (+1) (3 Semanas)
18) LINIKER E OS CARAMELOWS - Zero (-4) (12 Semanas)  
19) TOM ZÉ - Homologô (A Marcha Dos Blocos) (+1) (2 Semanas)
20) ELZA SOARES - A Mulher Do Fim Do Mundo (ESTREIA)

Sai:

CASSIANO ANDRADE - Deveria Ser (9 Semanas. Maior posição: 06) 



A NAVE VAI
Céu
Composição: Jorge Du Peixe

Mesmo não dizendo nem pra onde nem por quê
A nave vai levantar voo
Mesmo sabendo que o mundo anda sem você
A nave vai levantar voo

Mesmo não dizendo nem pra onde nem por quê
A nave vai levantar voo
Mesmo sabendo que o mundo anda sem você
A nave vai levantar voo

O vento leva pra onde não dá pra ver quem foi
De manhã sou um
de noite já fui dois
seremos quem somos
Ou serei quem sois
Ah, vou eu de novo

Mesmo não dizendo nem pra onde nem por quê
A nave vai levantar voo
Mesmo sabendo que o mundo anda sem você
A nave vai levantar voo

O vento leva pra onde não dá pra ver quem foi
De manhã sou um
de noite já fui dois
seremos quem somos
Ou serei quem sois
Ah, vou eu de novo

Vento levai
Ventura vem
Essa peleja vem da dor
Ando com o temporal
E acredito no vento
Que sopra a alma inteira
Chegou pra onde vou

O vento leva pra onde não dá pra ver quem foi
De manhã sou um
de noite já fui dois
seremos quem somos
Ou serei quem sois
Ah, vou eu de novo

Mesmo não dizendo nem pra onde nem por quê
a nave já levantou voo
mesmo sabendo que o mundo anda sem você
a nave já levantou voo

a nave já levantou voo
a nave já levantou voo


TH - Até Março! ;)


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