terça-feira, 23 de novembro de 2010

OS MUTANTES COM ZÉLIA DUNCAN: REFLEXÃO SOBRE A DESFEITA UNIÃO


Zélia: "Foi a maior aventura da minha vida"


Primeiro vamos falar dos Mutantes. Não são aqueles lá da (grotesca) trilogia-novelística da Rede Record. Trata-se da melhor banda de rock nacional - reinventiva e surtada, reconhecida e devotada por muita gente de fora como Kurt Cobain, Beck e David Bowie. Começaram na década de 60 e sua formação original contava com Rita Lee, Arnaldo Baptista e Sérgio Dias. Sua música misturava diversos ritmos brasileiros ao rock e possuia um apelo mundial, conferindo também um puta serviço ao movimento musical da Tropicália. Hinos como "Top Top", "Fuga nº II", "Ando Meio Desligado", "Panis Et Circenses" grudavam, ironicamente por serem totalmente anti-comerciais e pregarem antes de qualquer coisa o serviço necessário ao rock no país. Num dado momento, Rita se revoltou contra o caminho que as coisas tavam indo e saiu (ou foi demitida, nunca se sabe ao certo) e a banda continuou, até anunciar sua dissolução oficial ainda na década de 70.
2006: num evento em Londres dedicado à Tropicália, o quarteto Gal Costa, Tom Zé, Caetano Veloso e Gilberto Gil confirmaram presença. Choveram, então, na mídia boatos de que os Mutantes voltariam e inundaram hipóteses sobre quem substituiria Rita Lee, que não topou o regresso: "Parecem um bando de velhinhos querendo garantir a aposentadoria". Liminha, produtor e responsável por grande parte do sucesso da antiga formação, também não quis. Sérgio conheceu Zélia Duncan em certa ocasião e fez o convite por telefone: "Ela parecia realmente ser uma de nós, uma mutante convicta." Zélia, hesitante, ligou pra amiga Rita Lee e só então aceitou participar, consagrando o então retorno da banda.
Os fãs, claro, se dividiram. A alegria pela volta do grupo repartiu opiniões de quem achava que seria o mico musical do milênio, ainda mais com uma cantora de voz cheia de testosterona e completamente diferente da de Rita. "A Zélia não quer nem precisa ser a Rita. Ela vai doar um pouco do seu universo pra gente na participação e isso basta"
Ficaram juntos por um ano. Além do festejado show em Londres (que rendeu um DVD), voltaram ao Brasil e fizeram grandes shows em terras tupiniquins. Um deles, este que vos fala teve o prazer de contemplar, que foi no festejado Abril Pro Rock, de 2007, em Recife.
Então começaram os problemas. Zélia já havia deixado claro que não abandonaria sua (sólida) carreira solo, apesar de proclamar com alegria em seus shows que era uma mutante com orgulho. Lembro do mico que foi, num Altas Horas com os Mutantes, que pediram pra Zélia cantar "Catedral" no meio de uma apresentação da banda (...)
Como se concluisse um ciclo, Zélia deixou a banda e isso fez com que seu ex companheiro Sérgio Dias disparasse à imprensa: "Apressei-me em julgá-la como mutante. Ela parecia tanto sê-lo. A Zélia está mais para um "transformer"". Zélia evitou comentar sobre as declarações, mas ainda assim disparou: "Parece que quem dá esse título é a rainha da Inglaterra. Quem é menos mutante é ele (Sérgio), que fica naquele mesmo lugar". Sérgio tentou desfazer o mal entendido na imprensa, mas parecia já ser tarde...
Diferenças entre os membros à parte, vamos refletir um pouco: foi válida essa participação de Zélia nos Mutantes? Fez bem à carreira dela e somou alguma coisa à veterana banda?
Quando a notícia apareceu, minha primeira reação foi a de alegria: "Putz, minha cantora favorita, cantando na minha banda de rock preferida. Que máximo!!" Vi na TV o desempenho de Zélia com eles e tudo o que consegui pensar foi que a cantora trouxe uma dignidade gritante à banda - talvez isso pode ter, num futuro momento, soado como um defeito grave, visto que arranhou um pouco a anarquia que tanto foi marca característica de Arnaldo e Sérgio. Para a carreira de Zélia, da mesma forma, houve aspectos negativos. A cantora foi taxada de oportunista e de exagero na dose midiática. Em entrevista para o site "Música do Brasil", ela comenta o fato:

"Eu não acho que exagerei não, foi como eu quis, queria passar por isso. Era um risco tão grande que até acredito que saí ilesa. No sentido artístico foi ótimo para mim. Claro que tinha gente que queria me matar porque entrei nos Mutantes, mas sempre tem gente querendo matar outras por algum motivo. Eu tive momentos de extrema alegria com os Mutantes. O show de Londres foi maravilhoso, o show de São Paulo no Monumento do Ipiranga foi histórico, teve um em Porto Alegre que foi uma loucura, fizemos ainda um show em San Francisco, incrível. Então, eu tive a oportunidade de estar no palco com aqueles caras, e vivendo o rock'n'roll já com uma carreira solo, um privilégio para mim. Mas tinha de ter saído mesmo na hora que eu saí. Se eu tinha que ter entrado? Ah, tinha. Em relação a mim mesma, sim. E para a banda foi muito importante ali naquele momento. Eles precisavam de alguém, e algumas pessoas não tinham dado certo. E quando Sérgio me conheceu, foi fulminante. Entrei numas, liguei para a Rita, ela deu força, e falei, 'cara, vou viver isso, dane-se'. Mas a segunda turnê para a Europa foi heavy. Se não fosse, eu continuaria mais um pouco só. Eu não precisava ter saído de repente. Mas eu sou uma mulher de 44 anos (na época). Chegar, por exemplo, no aeroporto de Lisboa, não ter nenhum carregador e 50 volumes para todo mundo carregar. Desculpa, não vou fazer. Não vou, mentira, porque na hora eu fiz. Eu gosto de rock'n'roll, mas da música."

Fiquemos, então, com a reflexão, e um registro da parceria que com certeza entrará para a história do rock brasileiro!



A trupe que poderia ter dado (mais) certo (ainda)



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FUGA N. II
Os Mutantes. Participação especial: Zélia Duncan

Hoje eu vou fugir de casa
Vou levar a mala cheia de ilusão
Vou deixar alguma coisa velha
Esparramada toda pelo chão
Vou correr no automóvel enorme e forte
A sorte a morte a esperar
Vultos altos e baixos
Que me assustavam só em olhar

Pra onde eu vou, ah
Pra onde eu vou, venha também
Pra onde eu vou, venha também
Pra onde eu vou

Faróis altos e baixos que me fotografam
A me procurar
Dois olhos de mercúrio iluminam meus passos
A me espionar
O sinal está vermelho e os carros vão passando
E eu ando, ando, ando...Minha roupa atravessa e me leva pela mão
Do chão, do chão, do chão...


TH - Eu AMO essa...seja com Rita ou com Zélia!



7 comentários:

  1. Zélia é transcendental.
    Faz tudo o que toca virar ouro muito fácil!

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  2. Admiro a lucidez e a sensatez da Zélia. Também acho que ela saiu no momento certo.

    Eu gosto muito dOs Mutantes. Mas devo confessar, que à época, torci o nariz, quando soube da presença da Zélia. Tanto que nem fiz questão de saber sobre os shows e etc.

    Tanto que nem sabia dessas particularidades que você citou, como a declaração do Sérgio Dias.

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  3. TH

    Eu sou do tempo dos Mutantes com a Rita. Gostei de ter visto a Zélia com o grupo, mas ela fez bem em seguir a solo.

    Abraço.

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  4. Você tentou, Thiago, não opinar, mas li algumas opiniões tuas nas entrelinhas. O que mais me chamou atenção foi a postura reacionária do Mutante: contraditória.
    De todo modo, valeu a coragem da Zélia.

    Eu, pessoalmente, não acompanhei de perto este processo. Mas cosidero emblemática a passagem.

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  5. Achei completamente desnecessária essa volta dos Mutantes. A banda já foi, é passado. Os Mutantes jamais serão os mesmos sem a Rita Lee.
    Antes tivessem deixado claro que seria a banda Os Mutantes com a uma convidada especial: Zélia Duncan. O problema foi que a mídia inteira acabou transformando a cantora em um dos Mutantes. Deveriam ter anunciado essa volta como: Os Mutantes e Zélia Duncan, dois nomes consolidados da música, ou entao criar uma outra banda com cançoes inéditas e algumas músicas dos Mutantes, com um trabalho diferenciado, assim como fizeram Os Tribalistas.

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  6. Absolutamente naaaaaaada contra Zelia Duncan, mas Os Mutantes são os q tinha Rita Lee a frente e só!
    Bela analise querido!!

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  7. Este comentário foi removido pelo autor.

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